terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Mañana, mañana

Mañana, mañana chora... 
Aqueles caras lá fora 
querem minha cabeça, 
meu corpo numa bandeja, 
com direito a maçã na boca. 

Miña manha na forca... 
Eles querem justiça, 
fazer espetinho do meu coração; 
mas quem terá o que merece, 
o que é 'justiça' por definição? 

Amanhã, manhã, masmorra... 
Mas morra de cabeça erguida; 
sujo de sangue, consciência limpa, 
Pedro será pedra em Roma; 
então morra apreciando a vida. 

(Rhangel Ribeiro)

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Era Éris

Décima oitava manhã azul,
de uma primavera infecunda;
em que só uma toalha é florida,
em que a nossa vasilha é funda.

Girava a rosa dos ventos;
pássaros, pousavam, em bandos...
Galos ao meio-dia eram abutres voando,
sobre a triste carcaça do sofrimento,
roupa molhada, aguaceiro bento.

Nossa amada Tortinha, sem recheio
repleta de meandros.
Uma menina bonita
era Éris, enfeitada com fitas
abrindo seu wagasa,
para um mergulho, sem escafandro
do alto de um velho Jequitibá.

(Rhangel Ribeiro)

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

2%


Eu estava ali,
era qualquer coisa entre os que não souberam ou não opinaram,
o marginal, na margem de erro para mais ou para menos.
Negando o acesso negado, com a violência de todos os ligres.

Eu estava ali,
com os negros adultos adotados por famílias ricas,
com os escritores que amo.,
com lindas mulatas de olhos verdes,
e no troco de três centavos.

Eu estava ali,
bebendo tubaína com os comunistas,
acreditando que trabalho não define carater,
escutando os últimos romanticos,
e achando os Stones melhores que os Beatles.

Eu estava ali,
no senso,
no homem comum,
na minoria,
e na diferença.

Sendo que o senso e o comum
nem eram mais tão amigos...

(Rhangel Ribeiro)

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

As ruínas de Abaddom

Nas beiradas do vale da morte,
arremessava corações, feito pedras;
achava graça nas quedas
e nos sons, como canções ao fagote.

Fandangos, guarânias, sonatas,
minuetos, sinfonias, serenatas.
Que importa o que você foi antes
se o seu melhor não foi o bastante?

Aquela boca ri da sua cara.
A ferida não sara
e essa dor não sai.

Do desconhecido ecoa:Aguente!!
O ódio só cai aos pés do sobrevivente,
quando o sobrevivente não cai.

(Rhangel Ribeiro)



quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Sabe-se lá

Ela insistia.

-Ao menos apareça, com seu "Oi".
Mas ele não foi.
E ficou a sensação
de que aquilo ia ser bom...

A explicação?
Sabe-se lá!

Sabe-se lá
para onde se para
anda e vai
quando o semáforo esta´
estafado, em stand by ...

Medo?Talvez...

Eu me importo demais
com o que ainda não sei.
E se a lei não se faz
alguém há de aplicar
sua própria lei...

Qual a moral?
Lá, cê sabe...

Na escuridão
o sorriso é embargado,
os gatos são pardos
e os ratos são reis.

(Rhangel Ribeiro)


quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Rudá

Deitados em volta da mesma chama,
que a tempestade irá levar,
com suas lagrimas de lama,
sob a lâmpada lunar.

Rodeados por essas rochas, cheias de falhas
e por esse oceano, tão cheio de música;
carne, riacho, palha;
estão os homens dessa terra rústica.

Aqui incertezas desaparecem,
 em queda brusca.

E quem só acha
não busca
algo mais
que só achar.

E quando Rudá sumiu,
parece, o céu caiu;
e tapando feridas com malva,
eles oram por um ombro.

Porque seus sonhos são escombros
e toda criação vem da raiva.

(Rhangel Ribeiro)

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Minha Quadra

Aqui vi um maneta,
foi em um mês de maio,
num cavalo baio,
com uma baioneta.

Girei maçanetas,
usei blusas de lã,
mordi maçãs,
invejei lunetas.

Subi até tua sacada,
é a mais verde da rua,
mas não vejo a lua,
solitude ladra;

só senti,
que aqui, nesse quadro,
eu já  não me enquadro
só, sem ti...

(Rhangel Ribeiro)

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Algodões rubros

Camponeses zarpam
em jardineiras,
e nas corcovas dos cabriolés,
pelo caminho dos catolés,
cercados e paineiras.

Soldadinhos de chumbo,
liberdade em gaiolas,
é estado latente e beligerante.

Quebra-Nozes
na casa das máquinas.
Damas e ventarolas...
Fila indiana, cortejo elegante.

De carona, em jumentos
vão estudantes, crianças, mulheres,
com seus risos e cataventos,
abrir a cova dos malmequeres.

Na estrada das quimeras
sumiu mais um jovem moço.
Em um túnel de escuridão tranquila,
que ainda vira,
e vira poço.

(Rhangel Ribeiro)

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

RIP, RIP! ERRO!!

Estou sozinho,
porque sou errado!
Sou todo errado!
Tão errado
que até repito,
de maneira errada
a palavra 'errado'
no final dos versinhos...

'Mais pobre que uma rima pobre
é rimar uma palavra com ela mesma!'

É o que dizem...

Mas é melhor fazer isso,
que acabar usando
 a palavra errada,
no momento errado.

É o que digo...

Falam também
que estou no caminho errado,
e no lugar errado!
Se 'eles' vão para um lado,
eu, rapidamente, vou para o outro.

Eu mesmo não arrisco dizer que estou certo,
também acho, que realmente,
estou no lugar errado.

Mas sei
que assim,
seguindo no rumo contrário,
corro o sério risco,
de estar cada vez mais perto
do caminho certo.

(Rhangel Ribeiro)

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Para onde vão os imortais?

Vivem tua vida
sem tua presença,
apagam tuas pegadas,
e o crime re-compensa.

Mudam
de cidade,
fingem
 teu sumiço.

Fogem,
são omissos.
E entre a neblina, fina...
Desaparece a lealdade.

Fecharam tua cortina,
cobriram tua carcaça,
mas a luz da eternidade,
não passa, transpassa...

(Rhangel Ribeiro)

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Tão belas quanto breves

Sinto falta das folhas de outono,
não deveriam me fazer falta.

Eram apenas folhas secas no outono
espalhadas por toda parte.

Não sei se é por ter algo de 'arte'
que elas me tiram o sono.

Mesmo mortas, eram tão bonitas.
Aquelas breves folhas de outono...

É primavera, é inverno, é verão...
eu olho para o chão,
elas não estão mais lá.

E esse passeio público
que dizem ser de todos,
agora é menos meu;
é só 'falta do que fazer'

sem vocês
folhas de outono.

Vontade de observar
vocês que tem companhia,
que voam com a ventania...

Mas parece que o outono
nunca mais vai voltar...

(Rhangel Ribeiro)

sábado, 15 de junho de 2013

Cantil

Tão avoado, a toa
cheio de remendos
e caixas de remédios...

Esse mundo é tão louco
que nos dias ensolarados
eu prefiro me deitar na sombra,

sim, eu sei
que ao sabor do vento
o tempo não voa...

Mas voam aves,
gotinhas de garoa,
asa delta,
balão...

E pensando em como fazer bom uso da solidão
penso já estar fazendo bom uso dela,
e ela, com certeza, não me abandona;
é companheira inseparável!

Mesmo eu sendo tão pouco,
só mais um louco só
como esse mundo louco,
também solitário
em um canto qualquer do universo.

Sem saber se o universo tem canto,
procuro um cantil, um descanso
para cantar poemas.

Essas abstrações
que eu não consigo decifrar
e que ninguém mais quer ouvir.

(Rhangel Ribeiro)

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Ce n'est pas un poème

Estranho:
Esquisito,
desconhecido.

É estranho...
Antigamente mamãe dizia,
quando ainda me dava banho:

'Não aceite nada de estranhos!
Se uma coisa vem de um estranho,
só pode ser porcaria!'

Hoje em dia confundem idiotas
com estranhos...
Mas nem todo estranho é idiota,
e nem todo idiota, necessariamente,
é estranho.

Eu, por exemplo:
Não sou tão idiota,
quanto os verdadeiros idiotas pensam!

Só sou estranho mesmo...
E quando se é estranho
todos são estranhos!
Menos você.

Eu sou o céu,
um céu fechado,
quero me abrir,
mas engoli a chave,
me tranquei para fugir,
mas quero liberdade!

Nunca quis ser visto,
no entanto, não consigo
fazer "vista grossa"
para quem quer 'me ver'.

Aos poucos saio do limbo,
desse casulo lindo
feito por bichos da goiaba,
saio na base do pé de cabra!
Ao som de um coral de bezerrinhos,
para ser livre,
como uma gaivota!
Não,
como um  idiota.

(Rhangel Ribeiro)


quarta-feira, 22 de maio de 2013

Deapé

Como eu poderia agradecer
tanta sorte?
Tem algo de Augusto nela...
Tenho uma mão quente e pequena
em um inferno frio e sem norte.

Somos dois anjos da noite,
magriços,
perdidos,
sem penas;

apenas
rodeados
por cortiços
becos, putas,
e juntas...

E juntos,
perseguidos pelo gato de Alice,
traçando linhas sinuosas,
com nossas passadas tortas
como sinais vitais num monitor cardíaco,
como as trágicas histórias de amor
do fim do século quadrado.

Pela primeira vez não fiz nada de errado,
Ganhei um abraço forte e apertado afinal:
"-Rhangel, tenha uma boa noite!"
"-Faremos o que pudermos...
...Mesmo sem saber de nada..."

Eu, homem mal feito
que não sabia,
nem sei direito
o que é isso de 'amor'...

Caminhei entre a garoa fina,
e com o nosso fim,
o frio retornou,
com o vento
e a solidão...

Olha, veja só...
O cara que ama ficar só,
também tem um coração!

É...Eu não sabia
mesmo o que é o 'amor'...

Rhangel Ribeiro


sexta-feira, 10 de maio de 2013

Prece ao olhar onipotente


Senhor,
permita-me renascer
ainda que desse tamanho,
mas com a permissão de transgredir
e ter a indecência de ser feliz!

Eleva-me, até eu aprender
alcançar as nuvens
e colocar rolhas enormes nas chaminés das fábricas.

Onipotente,
quero finar-me em consciência
e viver o bastante para ser jovem,
nas melodias que me absorvem
e decantar minha decadência...

reaparecer
como um querubim,
um bebê numa banheira,
boiando na maré mansa,
com olhos de lince, ou de lança
para olhar direto nos olhos da menina
de olhos verdes-dourados-azul piscina...


Para aprender
a rir
e a chover pelos olhos.

Compreender
se riem de mim
ou  riem comigo.

E saber
quando um momento ruim
precede
um bom momento.

(Rhangel Ribeiro)

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Zé Isaac


O velho Chico
declarou a morte da canção.
O velho Quino
criou Mafalda pra uma marca de sabão.
O velho Zé Isaac
roubou uma pedra de sabão.

Mas deu azar...

Bateu de frente
com uma batida da policia militar,
foi abatido em um camburão,
e espancado, em frente ao Mercado Municipal.
R. Cap. Félix, 110 - Benfica

POW! POW!
Ploft!
As cortinas se fecham.
O povo aplaude.

Os dois primeiros?

Foram destaque no Jornal da cidade.

Zé Isaac?
Só mais um cadáver, na hora do almoço.

Zé ninguém,
Zé sem-rosto,
ninguém especial a ponto de ser
digno de aparecer em um Plantão da Globo, ou coisa assim...
Muito menos de ter um Tablet ou um Iphone.

Zézim.

Malabarista-palhaço de rua,
eu olho o redentor;
gigante de pedra-sabão,
de braços abertos
sobre o corcovado,
parecendo mais um suicida
que quer se jogar do alto de um prédio projetado por Niemeyer!

Expoente de uma geração!
De uma geração sem voz,
que não pede um guia,
mas  presta gratidão ao seu algoz!

TOMADA UM!

Respire, sorria,
palhaço!

Você está no paraíso!

Dizem que o ocorrido com as Torres Gêmeas
(obra de um árabe, compatriota de Seu Zé Isaac!)
foi o "maior ataque terrorista de todos os tempos!"

E Hiroshima e Nagasaki,
foi o que?
E eu com isso?

E eu?
Eu sou o que?

Eu vendo sentimentos
para quem não quer comprar!
E mantenho viva a luz
que não quer morrer jamais!
A geração muda,
eu-mudo.

sou a poesia,
cada vez mais muda!


(Rhangel Ribeiro)



quinta-feira, 2 de maio de 2013

Análise de risco



Base,


Muito os estudei,

porém hoje só me pergunto:

'insan's

o que pensam de mim?'

Tenho meramente o que me foi dito

nas pichações nos muros:
Não sejam otários!
Sejam libertários!

Nos bares,

e em becos cheirando a mijo

eironeia!


Descubro que a beleza...

Ah!Beleza
só se revela para quem merece!

Sabe,

tem quem sabe,
tem muitos querendo ensinar,
e poucos querendo saber.

Mas foi pouca a reflexão que vi!

Nesses anos que estive aqui.

Com mais sabedoria e meditação,

quem sabe,
enxergariam,

que não é uma

"grande corporação",
o ' grande vilão',

que o 'grande vilão'

está neles mesmos!
Em cada-um-deles

insan's!


É digno de lamento,

saber que uma vez insan,
insan 1, 2, 3...

Four

Ever!!

Me deixem longe,

me mandem de volta
já!!

Essa humanidade não me merece!

está me contaminando!

Magister,


Pouco aprendi...


E cada vez o número de perguntas

é maior que o de respostas!

O que pensam de mim!?

E vocês aí
ainda precisam de mim!?
            -
Sei que eles encontrarão isso,
mas jamais vão refletir!

Quid me vis?


(Rhangel Ribeiro)


domingo, 28 de abril de 2013

Deumus

Cansado,
desgraçado,
eu
sem dinheiro,
mas com o coração
batendo desengonçado
e a coação dos meus.

Sentado, na beira do pier
jogando xadrez, comigo mesmo,
onde dizem que fico a ver navios,
mas onde até hoje não vi navio algum.

Desisto desse jogo,
e jogo as peças e o tabuleiro,
acho uma concha de caramujo,
da para ouvir o mar;
posso sentir o cheiro...

Parece que
a noite,
pelo menos,
o mar me ouve...
Mas só parece,
porque o mar
não tem audição.

Agora sei que passo a impressão
de que me faço de surdo para o universo,
mas, por vezes,
sinto que todo esse universo
é que se faz de surdo para mim.

"Universo de pessoas",
que não são um "uníssono",
se desesperam em dúvidas,
brigam por dívidas,
juram, e jogam
coisas indevidas
que não estão divididas
em seus devidos lugares.

Me incomodam,
vulgares!

Fantasio...
Que bom seria...
Se o "homem médio e a mulher honesta"
e os ignorantes que amam
o que até para os dementes seria escalafobético,
fossem escanchelados por seres malacafélicos!

Comuns,
me perturbam!

Pois não estão organizados,
por ordem ou  função,
e por serem todos tão comuns,
recebendo ordens,
exercendo somente suas funções,
para no fim de semana ligar a televisão
e ver nádegas ao lado dos filhos.

Ora, se querem ver nádegas,
 vão a praia,
ao parque!
Desenhem nádegas!
Aprendam a esculpir bundas!

Mas ainda digo,
precisam de ordem!
Mas ordem sem obrigação.
não um exercito,
não!

O ser humano ainda
tem sua ordem natural?

Vagabundos, que sejam!
Mas que raciocinem e deixem
esse júbilo pelo bélico!

Sem poluição sonora,
nesse mar
um terceiro banho,
até que me cairia bem.

(Rhangel Ribeiro)



O Rei dos Bobos

O Rei dos bobos,
como em festejos juninos
sapateava e dançava elegante
nas marcações quiméricas
dos pisos extravagantes
feitos de raros
azulejos joaninos.

Ele cantava,
dançava
e caçoava do rei,
que  loucamente ria
e repetidas vezes dizia:

 "Oh, adorei! Adorei!
Mais uma vez, mais uma vez!"

Mas quando o dia morria...

O 'rei' dos bobos,
era só um bobo,

como todos os outros bobos daquela corte.

Descendo as ruas,
observando as luas,

ou aquela limpeza
de 'lençol azul escuro'
das noites desnudas
quando nem a lua da as caras...

Até ele,
o 'rei dos bobos'
chegar em casa,
tirar seu chapéu de civil,
suas sapatilhas pontudas,
quando então
já não era mesmo mais 'rei'.

Era só um ser vil...

um velhote mesquinho
que ninguém queria,

sem ter quem chore,
sem ter quem ria...

Não, não mais o 'rei',
mas um bobo só!

E sendo só um bobo,
escovava seus dentes,
com sua escova de cerdas macías
feitas com os pêlos dos porcos,

E como todos os bobos!
Olhava a água descer
em 'redemoinho',
junto com seu reflexo,
pelo ralo enferrujado da pia...

E dormia
descansando
para mais um dia,
de guizos, e risos
canções e saltos,

saltos altos,
'patifarias'
de um bobo ridículo,
de um  velho bufão,

com chapeau Bouffon!

(Rhangel Ribeiro)

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Scriba

O valor
tanto faz,
como tanto fez
tudo que eu "tanto fiz"
foi escrever.

Escrever
é só o que eu sei;
embora a vida
tenha me obrigado
a falar,
a desenhar,
tirar fotografias,
andar de bicicleta,
cumprimentar estranhos ,
sair do meu universo,
calçar minhas meias,
abotoar camisas,
amarrar os cadarços dos tênis
e olhar as horas no relógio de ponteiros.

Escrever,
é só o que eu sei,
tanto que nem sei se sou eu
quem escreve,
ou se já sou o que escrevo.
Tem vezes que nem sei que diabos sou eu,
só sei que esse meu "eu"
só sabe escrever

e é tudo que sabe,
tudo que cabe
nesse verbo

"escrever"

e isso é tudo.

(Rhangel Ribeiro)

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Deus é silêncio

Ainda,
de tempos em tempos
eu também preciso de um deus;

e enquanto os homens
(esses seres tão lentos...),
que se perguntam:
"onde estará deus no momento!?"
fazem barulhos nos templos,
clamando por salvação!

Eu só me deito,
e penso,
e pensando
é que sou "alado",
dou "asas" à imaginação.

Penso que,
com certeza,
deus pensa...

Acho que deus
e eu
somos até parecidos...

Todo olhos
e ouvidos,
preferindo silêncio dos filhos
que respeitam
o pai que sabe

aos ruídos
da pregação.

Quem sabe...
Deus é silêncio,

mas ainda tem coração.

Quem sabe
ele só está calado
porque é um velho, com ouvidos tampados
quando ligam essas caixas de som!

Homens,  pobres homens!
Acham que a humanidade tem muito o que falar,
sem imaginar

que talvez
deus
tenha se
cansado de só escutar,
sabendo que os homens
ainda  tem muito

 o que ouvir.

(Rhangel Ribeiro)

quarta-feira, 3 de abril de 2013

O espertar repentino

E de repente
eu era poeta.

E de repente
ela sabia.

E de repente
ela era a palavra.

E de repente
nós fomos poesia.

E de repente
era todo sábado.

E de repente
 era todo dia.

E de repente
eu fiquei tão prático

que de repente
ela era uma sílaba .

E de repente
eramos dízimas,

de repente
dúzias, divisíveis...

E de repente
eramos zero,

de repente
invisíveis...

E de repente
ela era um sussurro,

e de repente
ela era um resumo,

e de repente
eu fiquei tão leve...

E de repente
eu fiquei tão burro...

E de repente
nós íamos tão longe
que de repente ela existia!

E de repente
 não fomos
nem esse"de repente"

que tanto
 se repetia.

(Rhangel Ribeiro)

segunda-feira, 25 de março de 2013

INTE

Eu torço para ficar tudo bem,
mas não consigo me levantar da cama,
deus me apontou para o além,
lúcifer me jogou na lama,
"amigo, você deve estar tão Zen"
o sol é um rifle apontado pra minha cara.

Seu idiota!Sua vida não é dura!
Eu ensinei todos os discípulos,
hoje, velho, mestre,
 trancado na clausura.

A coragem de ser livre,
de tomar decisões,
a liberdade
 está cheia de obrigações.
Ser mestre é ser servo,
é ser pupilo.

No espelho,
minhas pupilas,
minha menina dos olhos
tão confusa.

Eu, confuso,
não me iludo,
você sou eu ao contrário,
desde que a linha reta
encontrou a obtusa.

(Rhangel Ribeiro)


quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

A cruz e a aquarela

Paraíso além da paisagem,
o messias além da imagem,
a beleza da papoula
além do ópio,
longe do retorno de uma silhueta
de sentar-se sob uma  árvore de ampulhetas
e aguardar
ou procurar rever
uma combinação de caleidoscópio.

Um pintor doido e doído,
que pintava os quadros mais coloridos
mas que mostravam as cenas mais tristes;

suas tintas
eram seu sangue,
seu corpo
e espirito
transbordando e gritando:
"Grite!".

Tornando vivos sentimentos mortos
em seu campo amarelo
de mato velho
feito pepita de ouro.

Seu único tesouro
era não ser perfeito,
o artista "pronto"
estava no que lhe faltava,
em sua doce e amarga
falta de jeito.

(Rhangel Ribeiro)



segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Móbiles

Desligado,
em qualquer rua do centro da cidade,
desci até o subterrâneo
de uma loja com portas de vidro;

vi um teto de noite estrelada
e fileiras de berços com móbiles,
personagens, animais e galáxias
que ficavam girando e girando...
Para distrair um filho
que  ainda não havia chegado.

Ah, se nossos bebês soubessem!
Que podem ter o sistema solar ao alcance dos dedos
quando ainda não existe o medo
de demonstrar o medo que se tem!

Pobrezinhos,
eles ainda não sabem
do crescer,
do virar adulto,
do falecer
e do virar adubo.

Mas mesmo assim vão crescendo
indiscriminadamente
e deixam de chorar com toda força
sem medo de serem chamados de fracos,
e de rir naquela alegria espontânea
que, talvez, só quem não entende nada
entenda.

E envelhecem...
Até seus nomes ficarem ligados
apenas a uma lembrança,
que vai sumindo, e sumindo...
Até virar poeira.

No fim das contas
é tudo a mesma coisa,
e todas as coisas estão ligadas...
e assim como os bebês
ainda não entendemos
que todas as etapas são necessárias.

Ah, se esses bebês  soubessem!
Que não passamos da peça central de um móbile
com interrogações dependuradas ao redor,
que é parte de um móbile maior
do qual, felizmente,
não estamos no centro.

(Rhangel Ribeiro)


quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Decepções

Se até a indiferença decepciona
a decepção jamais é indiferente,
perturba os iguais e os diferentes
e igualmente
os que arriscam ou ambicionam.

Ela é um fantasma com as mãos enfiadas dentro dos bolsos,
é o tumulo das ideologias vencidas,
e o calabouço dos desejos irrealizáveis.

Ela persegue os miseráveis,
os medíocres, os ricos,
o maduro e o podre
os pastores e os padres...

A decepção é, potencialmente, o abandono da esperança;
testa a fé, a descrença e provoca a piedade.
Não se importa com o que é "sagrado" ou "importante",
e é  pesadelo de homens de boa, e de má vontade.

Se adaptar a ela
é fundamental para a sobrevivência humana
(e de tantos outros animais...).

A decepção não é algo novo,
mas, por vezes, faz parte do processo em que as coisas novas surgem;
pois não é apenas inerente aos fracassados, aos que erram e aos que perdem,
mas também aos que tentam,
que mudam,
que conseguem,
que se renovam,
e que ressurgem!

Ainda que tardiamente,
quando já não existem

decepções.

(Rhangel Ribeiro)

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Manual prático de existencia


Aquela ave assobiando
aquele canto inacabado
do compositor desafinado
seguia me desafiando...

Não poderia adiar mais um dia.

Levantei com um sol que me batia na cara
como se me chamasse pra briga,
e tomei um desjejum de rei
para aguentar quem tem o rei na barriga.

Saí pensativo...

É demasiado esquisito
a existência ainda não ter um manual prático.

Sofro porque existo!
Talvez soe até antipático...

Mas sou aquele tipo de chato
que ainda espera o dia
e ainda aguarda o instante
em que sua antipatia
se tornará cativante!

É diferente, entende?
(e quem entenderia...)

E de repente,
não mais que...
em plena correria
me ocorria
que se existisse mesmo
 um manual prático de existência
certamente esse manual diria:

'Dispense esse dia a dia intolerável,
esse dispersar de amanhecer que lhe entardece,
insignificância, grandeza... Esquece
que até mesmo o perfeito um dia vai acabar!'

Diria,
mas não existe
só o que existe
é nossa capacidade de pensar!

E vejam só...
Pensei tanto
que me perdi.


(Rhangel Ribeiro)