segunda-feira, 19 de junho de 2017

Telegrama de cartão postal

Irmão,
a fumaça abraça,
a nós, 
nascidos da fumaça.
Porém o futuro, sempre distante,
distante de onde se mora,
violento, nos arrasta pra fora.
Futuro: não é o mesmo de antes.
Digo assim que vivo com medo,
do que nem aconteceu.
Tenho pensado muito,
o controle não é mais meu.
Penso de tanto ver rua criar musgo.
Penso de tanto ver chover
e a avenida ficar escorragadia
feito gelo.
Nesta cidade não faz frio.
Barulho de vento é barulho de vazio.
Vazio de fruta que fica mofada,
de grito que some no horizonte.
Irmão,
a solidão é uma praça,
onde a gente bebe e sorri,
 até perder a graça.
Há um relógio de Igreja desligado,
para um Deus que caçoa das horas.
O tempo é uma piada que Deus não explica.
Mas Deus não explica nada. E agora?
Fugir para perto?
Ficar bem longe?
Não estar estando
é estar estranho.
Essas rochas cheias de limo.
Esse mormaço que sobe do limbo.
Tudo irrita. É o tipo de lugar que vamos
quando não estamos no nosso lar.
Lar: aprendi o que é voltando.
Esse buraco é uma carie em uma boca qualquer da terra,
gargalhando de uma piada infeliz
e quem contou fui eu.
Fui eu.
(Rhangel Ribeiro)