terça-feira, 27 de novembro de 2012

Piá


Um piá perdido no ontem,
que planejava o muito que teria;
nesse minuto constata
que o muito pouco que teve
era bem melhor na teoria.

Sem paixões, sem amor, sem companhia;
Piá, quem te vê quem te via...

No limite do suportável
tu fez do existir pesado ofício
e não valeu o sacrifício;
foi pro saco,
virou vicio.

Piá, você é o que é,
mas não é o que queria...

Não aproveitou o dinheiro,
que logo não trouxe a felicidade,
essa imagem de paraíso, que em sua totalidade
é devaneio, é utopia,
mero desejo, que portanto não tem preço;

(a infelicidade por outro lado...
Piá, já sabe, custa caro... ).

Piá deixou de ser piá,
andou com os próprios pés,
mas por caminhos traçados...Por quem?
(não sabia).
Piá ia passando da idade
(e não sabia).
Piá perdeu a liberdade
(e não sabia).

(Rhangel Ribeiro)

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O que mais agora?

Os otimistas já não negam
terem medo de um futuro
onde a pouca cultura que pensa
a imprensa já não escuta;

Onde os poucos leitores que restam
só leem o que a imprensa divulga;

Onde poucas pessoas sentem,
e os poetas sentem muito...

Onde as respostas são mastigadas
e trituram as perguntas;

Onde a grosseria absoluta
é digerida com elegância;

Onde a minoria que discorda
é acusada de ignorância;

Onde as pessoas consideradas inteligentes,
não são mais as que discordam,
mas as que ignoram.


(Rhangel Ribeiro)

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

O abismo das memórias


Não aprendi com meus erros,
não me lembro de ter errado,
tenho muita coisa guardada na mente,
muita coisa que não sei pra que serve,
mas que sempre pensei que servia pra alguma coisa.

Assim são minhas memórias,
quanto mais longe, menos visíveis,
e quanto mais invisíveis, melhores;
telas em branco, esculturas sem significado
mas que ficam lindas quando cobertas de verniz!

Fábricas de loucos,
que contam e ouvem histórias
de um reino tão bonito,
que tinha aroma de alcatrão!
Onde havia palácios, ilusão, armadilhas...

Onde palhaços formavam quadrilhas
e sob lençóis de perfeição
escondiam abismos infinitos!
A confusão, o silêncio, o grito,
o romantismo perdido,
mais perto do chão.

Tenho pra mim
que as boas recordações
são assim,
 um misto de bobagens
e fantasias...
Que o único erro
bom de lembrar
é o erro do outro.

E ainda que só me reste
restos de um cobertor imundo,
quero lembrar
dos meus últimos segundos de delicias,
na delícia dos meus últimos segundos.

(Rhangel Ribeiro)