segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Fúria rotineira

Presas e prezados,
purgantes no purgatório
é um transe transitório,
brincam de dar corda
em quem não esta acordado.

Mais uma vez o sol vai nos ver nascer quadrados
e tomar sorrindo nossa dose diária de raiva:

Droga que faz o sorriso do outro
 parecer insuportável.

Vamos nos deparar com Romeus e Julietas
e seremos seus Montecchios e Capuletos,
entre He-man's e esqueletos,
aqui onde jaz os contos da mãe preta.

Porque o futuro que a gente encontrou
não era  aquele que a gente queria;

não explica, mas justifica;
não se encontra, mas se cria.


(Rhangel Ribeiro)

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Interrogatório

Se raramente dura até o além,
se isso já não tava indo bem,
se foi quase tudo muito bom,
se a perfeição não foi um dom,
se o infinito é uma incerteza;
o que é bonito?O que é beleza?
Se já não era mais amor...
Pra que saudade?Pra que rancor?

Se foi um grande conto do vigário,
se foi um mundinho imaginário;
pra que essas canções de amor sem sal?
Pra que fazer um fim de namoro adolescente
parecer um fim do mundo, se no fundo
a gente sabe que é só um temporal?
Por que o conformismo me parece melhor?
O amor deveria ser racional
ou a única razão deveria ser o amor?

Que porcaria de poeta é esse
que não sabe nem consolar um coração ferido?
Que maravilha de poeta é esse
que prega corações partidos
como quem martela uma tábua velha?
Será que o abatimento é um degrau quebrado
em um casebre, em qualquer beira de estrada?
Será que a razão torceu o pé nessa escada
enquanto brincava de cabra cega?



E martela, e martela...
O tempo, a consciência...
Martelam,  martelam...
Até que você se de conta
que esse é um barulho inútil ,
 no meio de tanta paz,
no meio de tanto nada...


(Rhangel Ribeiro)

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Anti-ontem


Quando os cães de caça
pararam  à  beira do abismo,
enquanto um nó de pescador
estragava a gravata mais cara,
quando a prensa do operário
amassava o  belo chapéu panamá,
e quando as lavadeiras jogavam Q'Boa
para manchar os uniformes engomadinhos,
eram tempos de utopia e pessimismo.
Eu sei, eu não estava lá;

eu não estava mesmo.
Foi tudo tão de repente...
Tanto que eu nem havia nascido,
em 91 tudo já era culpa da gente:
Povo cabisbaixo e ressentido,
que agora carrega esse poder tão sofrido,
essa culpa de ser inocente...
Esse mau hábito de dizer sempre
 "sim senhor!" pra tudo.

Eu já disse que o indicador do ditador
não é o mesmo, que agora,  indica o parente,
mas quem quer saber a diferença?
Falo com as paredes...Na expectativa
de que um povo que  segue andando
entre tantas alianças, em círculos, sem lado,
um dia perceba que não anda pra frente,
e que de tanto correr nessa esteira de hamster
acabe ficando cansado.
Mas até agora,  ninguém parou  pra olhar,
nem para o próprio indicador...
Sigo falando sozinho.

Eu sinto, não é dessa vez
que esse país muda.
Eu bem sei...É verdade,
que a realidade não muda,
se ninguém quiser mudar
a própria realidade.

(Rhangel Ribeiro)